quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

A necessária e urgente prisão de Eduardo Cunha


  "No caso Cunha, a consumação delinquencial se alonga, com ocultação permanente de capitais em contas correntes. Tudo não declarado no Brasil, com evasão de divisas e dinheiro em odor de corrupção. Trocado em miúdos, pode-se dar voz de prisão em flagrante a Cunha." - Wálter Maierovitch

Rodrigo-Janot
Janot poderia pedir a prisão preventiva de Cunha (Elza Fiúza/ Agência Brasil)



Lavagem de dinheiro, definiu o STF, é crime permanente. Eis mais uma razão para encarcerá-lo


Texto de Wálter Maierovotch, publicado na Carta Capital

Pouca gente sabe, mas existe uma Escola de Cidadania na esquecida e populosa 

zona leste da capital de São Paulo: 3,3 milhões de indivíduos. Está instalada no 
bairro de Ermelino Matarazzo, funciona na Igreja de São Francisco e depende d
o trabalho do seu fundador, Antonio Luiz Marchione, o popular Padre Ticão.

Neste mês de dezembro participei, com o arquiteto Ruy Ohtake e a deputada Luíza 

Erundina, de dois colóquios de fim de ano. Os formandos e a comunidade ouviram 
considerações sobre a atuação e o comportamento ético de Eduardo Cunha, presidente 
da Câmara, e o impeachment.

Este é um instituto para julgamento político nascido no Parlamento inglês, em 1376, 

quando reinava Eduardo III e diante de acusações de incompetência e corrupção 
dos seus ministros e da sua amante Alice Perrers: oimpeachment restou incorporado
 ao sistema da Common Law.

Para defender a urgência na decretação da prisão cautelar de Cunha, lembrei prever o 

nosso ordenamento legal a prisão em flagrante delito e estabelecer o poder-dever 
das autoridades em dar voz de prisão, diante de situações estabelecidas na lei 
processual penal.

Mais, frisei o fato de poucos saberem que o nosso Código Penal contempla 

delitos de consumação instantânea e crimes permanentes: nos permanentes, 
o momento consumativo prolonga-se no tempo, como, por exemplo, na 
extorsão mediante sequestro. Aí caberá a prisão em flagrante enquanto a 
vítima for mantida em cativeiro, sob domínio do sequestrador.

Importante lembrar, ao tempo do julgamento do “mensalão”, ter o Supremo 

Tribunal Federal (STF) decidido, com relação ao crime de lavagem de 
dinheiro (e Cunha está sendo acusado de lavagem de dinheiro), tratar-se d
e crime permanente.

No particular, o STF desprezou o entendimento de doutrinadores a sustentar a 

lavagem de capitais como crime instantâneo de efeito permanente. Pela atual 
jurisprudência do STF, o crime de lavagem de dinheiro se protrai, se alonga 
no tempo, ou seja, é crime permanente.

No caso Cunha, a consumação delinquencial se alonga, com ocultação 

permanente de capitais em contas correntes. Tudo não declarado no Brasil, 
com evasão de divisas e dinheiro em odor de corrupção. Trocado em miúdos, 
pode-se dar voz de prisão em flagrante a Cunha.

Como reforço, convém lembrar o caso Delcídio do Amaral, preso 

preventivamente, tendo o ministro relator Teori Zavascki sustentado tratar-se 
o crime de formação de organização criminosa, de natureza permanente, e 
que poderia, até, ensejar prisão em flagrante.

O mesmo raciocínio empregado pelo ministro Teori poderia ser adotado pelo 

procurador-geral da República, Rodrigo Janot, numa representação de 
imposição de prisão preventiva de Cunha.

Uma custódia, aliás, mais do que necessária, como é público e notório, para 

garantia da ordem estabelecida, conveniência da instrução criminal e a fim de 
se assegurar, no caso de condenação, a aplicação da lei penal.

Não se deve esquecer, ainda, poder qualquer cidadão representar ao procurador 

Janot para avaliar e eventualmente postular no STF a prisão preventiva de Cunha. 
Não se aconselha, embora legal, voz de prisão dada por comum mortal, pois a 
esperteza de Cunha poderia transformá-lo em vítima de desacato.

Por outro lado, a presidenta Dilma, é sabido, não está sendo acusada, ao 

contrário de Cunha, de corrupção e lavagem de dinheiro, crimes comuns. 

Na denúncia mandada processar por Cunha, imputa-se contra Dilma autoria de crime de responsabilidade no exercício das funções presidenciais, por infração à lei em face de: 1. Créditos suplementares não autorizados pelo Congresso. 2. Irregularidades na Petrobras, com destaque à aquisição de Pasadena. e 3. Pedaladas fiscais, mediante adiantamentos realizados por bancos públicos.

Em casos de impeachment, o julgamento do mérito das acusações é político e cabe com exclusividade ao Senado, vencida a fase de admissibilidade da acusação na Câmara.

A bem da verdade, gasta-se tinta ao sustentar a falta de fundamento jurídico para o impeachment sem se bater à porta do Supremo Tribunal Federal. Em uma situação como a atual, cabe sim ao STF analisar e decidir sobre ilegalidades e inconstitucionalidades.

A Corte, assim, poderá decidir se as acusações contra Dilma, em tese, se adequam ou não ao crime de responsabilidade. E o STF poderá declarar ser inadmissível o impeachment por atos ocorridos no primeiro mandato de Dilma, conforme está claro no artigo 86, parágrafo 4º da Constituição.

É ingenuidade achar que, no Senado, haverá julgamento à luz de aprofundado exame de questões jurídicas, mais especificamente sobre a tipicidade e a presença de intenção dolosa. Num julgamento político, colhido na base do “sim” ou “não”, pode contar o fato de outros presidentes terem dado pedaladas e não ter havido dolo por parte de Dilma.

Mas pode contar a oportunidade da permanência na função e de se considerar Michel Temer como a salvação da lavoura. Caso a decisão do Senado seja condenatória, o STF, salvo irregularidades formais e nulidades, jamais cassará decisão de mérito.

Wálter Maierovitch
No Carta Capital

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