segunda-feira, 8 de agosto de 2016

A hipocrisia da República de Curitiba:Após Odebrecht incriminar PSDB e PMDB, Lava Jato não está satisfeita


"A revelação dos repasses provenientes de esquema de corrupção, em sistema de caixa dois para campanhas eleitorais, tanto para o PMDB, quanto para o PSDB - partidos articuladores do impeachment de Dilma Rousseff - não provocou a mesma reação à equipe de Sérgio Moro que o impacto manifestado pelos jornais e opinião pública neste final de semana."

Segue o texto de Patrícia Faremann, para o Jornal GGN:


 
Jornal GGN - Uma semana após Marcelo Odebrecht delatar o repasse de R$ 23 milhões de caixa dois à campanha de José Serra (PSDB-SP), à Presidência em 2010, e de R$ 10 milhões em dinheiro vivo para o PMDB, a pedido de Michel Temer, um dos procuradores da força-tarefa da Lava Jato disse que o acordo com o executivo "ainda não está fechado": "Ainda temos um longo caminho à frente".
 
A revelação dos repasses provenientes de esquema de corrupção, em sistema de caixa dois para campanhas eleitorais, tanto para o PMDB, quanto para o PSDB - partidos articuladores do impeachment de Dilma Rousseff - não provocou a mesma reação à equipe de Sérgio Moro que o impacto manifestado pelos jornais e opinião pública neste final de semana.
 
Foi a Veja que revelou um jantar, em maio de 2014, na residência oficial de Temer, o Palácio do Jaburu, na presença de outro cacique do PMDB, Ediseu Padilha, braço direito e atual ministro-chefe da Casa Civil do governo interino. Na ocasião, Michel Temer pediu "apoio financeiro" a Marcelo Odebrecht, na forma de caixa dois.
 
Como Marcelo sabe que um dos requisitos exigidos pela equipe de Sérgio Moro para aceitar um acordo de delação é, além de trazer informações "novas" que outros delatores ainda não forneceram, mostrar provas materiais que confirmem os depoimentos, o executivo prometeu à força-tarefa apresentar registro de contabilidade da Odebrecht dos R$ 10 milhões de caixa dois repassados em dinheiro vivo.
 
Desse total, R$ 6 milhões teriam sido destinados a Paulo Skaf, presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), que disputou naquele ano o cargo de governador pelo PMDB, e outros R$ 4 milhões tiveram como destinatário final o próprio Eliseu Padilha.
 
O comprovante dessa remessa está, segundo o executivo, na contabilidade do setor de operações estruturadas da Odebrecht, denominado pelos investigadores como "departamento da propina" e apontado, inicialmente, como o registro de caixa dois repassados ao PT. 
 
Em resposta, o interino disse que o jantar ocorreu, mas que conversaram "sobre o auxílio financeiro da construtora Odebrecht a campanhas eleitorais do PMDB, em absoluto acordo com a legislação eleitoral em vigor e conforme foi depois declarado ao Tribunal Superior Eleitoral". 
 
De acordo com os dados do TSE, a Odebrecht repassou R$ 11,3 milhões ao PMDB. Esse montante de outros R$ 10 milhões ocorreram por fora, via caixa dois, segundo Marcelo. Se comprovado esse repasse, fica caracterizado que a quantia não esteve de acordo "com a legislação eleitoral" como explicou Temer.
 
Além desse trecho da delação, o conteúdo entregue por executivos da empreiteira também carregou outras "novidades" para os investigadores da Lava Jato. Dessa vez, a repórter da Folha de S. Paulo, Bela Megale, mostrou outro capítulo dos preparativos do acordo: um aporte da Odebrecht de R$ 23 milhões, como caixa dois, para a campanha do tucano José Serra (SP) à Presidência da República em 2010, hoje, atual ministro das Relações Exteriores.
 
O valor corrigido pela inflação equivale a R$ 34,5 milhões. A quantia foi enviada, em uma parte, no Brasil, e outra por depósitos bancários em contas no exterior. Também neste depoimento, os executivos prometem mostrar provas dos repasses: os comprovantes.
 
A exemplo do que ocorreu com os peemedebistas, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) registrou R$ 2,4 milhões da empreiteira para o Comitê Financeiro Nacional para Presidente da República do PSDB (que equivale a R$ 3,6 milhões). Mais o montante enviado pela Odebrecht, as contas atingiriam um total de R$ 25,4 milhões à campanha do tucano.
 
Não apenas incriminando Serra, os executivos informaram, ainda, que a negociação para o repasse se deu com a direção nacional do partido, que distribuiu à Serra e a outros candidatos do PSDB em 2010. Ainda, nos registros de contabilidade da companhia, os funcionários identificavam José Serra pelos codinomes "Vizinho" e "Careca". Os arquivos serão apresentados aos procuradores da Lava Jato. Ou seriam.
 
Isso porque da delação com os funcionários da Odebrecht ainda se exige mais. Mesmo após as duas grandes revelações, descobertas neste final de semana pela imprensa, os procuradores e investigadores não se dão por satisfeitos com os relatos - o que confundiu as interpretações noticiosas e análises editoriais: para os jornais, faltava a Odebrecht trazer "informações novas" para os investigadores aceitarem os acordos.
 
 
Além da novidade, era de amplo conhecimento, a exemplo da tática adotada nos últimos meses pela equipe da Lava Jato, que os investigadores exigiam, junto às delações, documentos e arquivos que comprovem as informações prestadas. A medida facilita o trabalho de comprovação dos ilícitos, uma vez que a delação, por si só, não se pode considerar como único meio de prova.
 
Na última quinta-feira (05), por exemplo, Marcelo Odebrecht prestou um depoimento de cerca de dez horas aos procuradores da República. A expectativa é que a temida delação incrimine cerca de 100 políticos, na negociação feita desde maio deste ano. Apesar de os investigadores já caracterizarem os conteúdos como "satisfatórios", ainda exigem de Marcelo certos detalhamentos.
 
Se no início das investigações que arrolou mais fortemente a Odebrecht, o objetivo da força-tarefa era mirar os repasses ao PT - lembrando que a superplanilha da empreiteira foi apreendida na 23ª fase da Lava Jato, a Acarajé, que apurava o suposto pagamento de propina em campanhas petistas comandadas por João Santana e Mônica Moura - as delações não só ainda não trouxeram provas diretas contra Dilma, como também abriu o leque do foco inicial. 
 
Nem o nome da presidente afastada Dilma Rousseff ou de Luiz Inácio Lula da Silva apareceram na gigante lista, agora detalhada nas delações. Em contrapartida, entre os nomes que aparecem como possíveis beneficiários do esquema de caixa 2, estão o senador Aécio Neves (PSDB-MG), o atual ministro José Serra (PSDB-SP), o deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), Renan Calheiros (PMDB-AL), Jorge Picciani (PMDB-RJ), deputado Bruno Araújo (PSDB-PE), Francisco Dornelles (PP), o governador Beto Richa (PSDB), entre outros.
 
Mas, após o boom midiático com a incriminação efetiva pelos delatores da Odebrecht de campanhas tucanas e peemedebistas, resta saber o que falta aos procuradores para aceitarem as delações e essas outras miras.

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