quarta-feira, 9 de novembro de 2016

A PEC da destruição da economia brasileira, por Roberto Requião



GGN.- A PEC- 241 - 55, caso viesse a ser aprovada, provocaria a mais profunda e prolongada depressão na economia brasileira, maior do que a observada nesses dois últimos anos, tendo em vista a projetada contração de investimentos e gastos orçamentários ao longo de 20 anos. Antes de completar seu tempo, ou o tempo intermediário de 10 anos, o país mergulharia ou na indigência mais absoluta dos pobres ou na guerra civil. O Senado da República pode impedir isso. E a forma de impedi-lo é apresentar e aprovar uma alternativa.
É falso que a situação fiscal em que nos encontramos caracteriza uma crise aguda, o que justificaria medidas extremas como a PEC-55. Nossa situação fiscal é melhor, em termos estruturais, inclusive quanto à relação dívida/PIB, do que a maioria dos países. Temos, sim, uma crise conjuntural que resultou em queda aguda de receita devida à contração da economia, o que se deveu, por sua vez, às consequências da Lava Jato no sistema Petrobrás – o maior investidor brasileiro, que reduziu drasticamente seus investimentos – e o chamado ajuste Levy, praticamente imposto pelos neoliberais ao Governo anterior, e agora replicado sobre o atual Governo com maior rigor.
Podemos reverter rapidamente esse quadro conjuntural. Não é preciso ir longe. Façamos o que foi feito em 2009 e 2010, em termos macroeconômicos. Na ocasião, caso não se lembrem, depois de drástica contração da economia devida à crise global de 2008, o Governo brasileiro determinou, entre outras medidas – inclusive o aumento do salário mínimo -, que o Tesouro Nacional emprestasse R$ 100 bilhões ao BNDES para que irrigasse a economia. Em 2010 repetiu a dose, agora com R$ 80 bilhões. O resultado foi um espetacular crescimento do PIB de 7,5% em 2010. Um crescimento chinês, não obstante a aguda crise mundial.
Acontece que os neoliberais não se contentam com alegria fácil. Por pressão deles, e de gente muito próxima do Governo da época, o ministro Mantega decidiu contrair a economia com medo de um suposto superaquecimento. Foi nosso azar. Caímos na mediocridade do crescimento do PIB nos anos subsequentes e jamais saímos disso, até o descalabro atual em termos de política econômica. Hoje, constatamos o absurdo de um governo que quer que o BNDES, em vez de promover política anticíclica, pague ao Tesouro os recursos que lhe emprestou no meio de uma crise que, quantitativamente, era menor que a atual.
Qual é a alternativa? A alternativa, senhoras e senhores senadores, já foi inventada há muito tempo, é a velha política anticíclica: na alta do ciclo econômico, o governo promove o equilíbrio orçamentário; na época de baixa do ciclo, o governo investe deficitariamente. É exatamente isso, investimento deficitário. É pelo financiamento do déficit, inclusive monetário, que o governo introduz dinheiro novo na economia de forma a reanimá-la.  Esse déficit não gera inflação, já que a economia encontra-se numa situação de demanda baixa, portanto com baixa pressão de consumo.
Diz-se também que é uma política keynesiana, só lembrada em termos de depressão. Em 2008, por exemplo, o conservador Sarcozy proclamou no G-20 que todos haviam se tornado keynesianos. O problema é que, também entre os alemães, políticas keynesianas não são populares. A Alemanha confia em superávits comerciais, o que não deixa de ser uma contribuição efetiva ao crescimento. Acontece apenas que, por uma fatalidade aritmética, não há como todos os países fazerem superávit comercial simultaneamente. Mas foi por essa crença histórica que a Alemanha obrigou a Europa do euro a voltar, depois do breve ciclo inicial de expansão fiscal, ao receituário neoliberal. Isso levou à virtual falência países como Grécia, Espanha, Portugal, Irlanda, e até Itália.
Apoiada no FMI, no Banco Mundial, na OCDE e no Banco Central Europeu, controlados todos pela Alemanha, deu-se o nome de “exit strategy” às estratégias de saída das políticas de expansão na Europa, com influência no mundo inteiro, exceto os Estados Unidos. Neste caso, o neoliberalismo é seletivo: serve para os outros mas não para os de casa. De fato, os déficits públicos anuais norte-americanos foram, sucessivamente, a partir de 2009, de 1,4 trilhão de dólares, 1,3 trilhão, 1,2 trilhão, 1,1 trilhão, 1,0 trilhão e só baixaram da casa do trilhão de dólares recentemente, caindo para cerca de 600 bilhões e 400 bilhões.
A política preconizada pela PEC-55 é algo parecida, porém de consequências muito mais drásticas, do que a matriz imposta pela Alemanha na Europa. Seus efeitos no setor público seriam devastadores, mas igualmente devastadores, talvez com consequência ainda mais drásticas, seriam os efeitos devidos à relação entre setor público e setor privado. Basta um exemplo: tome-se o investimento público em construção. Se ficar congelado por 20 anos, como quer o Governo, seriam congelados os investimentos privados conectados em cimento, ferro, tijolos, móveis, telhas. Ao mesmo tempo, ou seriam perdidos, ou seriam deixados de criar centenas de milhares de empregos. Na verdade, parte substancial da economia brasileira seria destruída.
A alternativa a esse processo de destruição é particularmente simples, e indolor para a cidadania. Diz-se que não há almoço grátis. É falso. O almoço dos banqueiros, ou seja, a contrapartida da criação de moeda por eles, é inteiramente grátis. Quando se fala em investir deficitariamente o que se quer é fazer com que o Estado se aproprie de pelo menos parte desse dinheiro de graça – receita de senhoriagem – para colocar a economia na trilha do crescimento rápido, vencendo uma depressão que já dura dois anos e provavelmente, se nada for feito em termos de investimento, se estenderá para os próximos.
Concordamos que para enfrentar a crise fiscal conjuntural é fundamental tomar as medidas seguintes, que substituiriam as propostas inconsequentes da PEC-55:
1.    Política macroeconômica anticíclica, centrada em gastos em serviços públicos e na retomada de investimentos em energia e logística;
2.    Retomada imediata dos investimentos da Petrobrás ao nível de 2014, tendo em vista seu efeito imediato na própria cadeia produtiva e no resto da economia;
3.    Renegociação em níveis razoáveis das dívidas dos Estados junto ao Governo federal, de forma a liberar recursos de investimento em nível local.
Roberto Requião, Senador

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